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III – I – Consumidores Globalizados – Porém, Mais Adictos

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Texto – V

Transformações de ordem econômica, sociológica, tecnológica, e cultural modificaram completamente as relações de consumo, trazendo consigo um novo perfil de consumidor/adicto. Não é fácil definir o que significa o “novo” consumidor/adicto, obviamente uma analogia com o conceito de uma ‘nova economia globalizada’ onde tudo agora é World Wide Web – www – em uma escala nunca antes alcançada por um meio de comunicação. A criação desse espaço é do físico inglês Tim Berners-Lee. Foi ele quem inventou a World Wide Web, conhecida por essa sigla www. Sobre a Internet ele declarou que: "a web é uma criação social construída para um efeito pessoal – ajudar as pessoas a trabalharem juntas – e não um brinquedo tecnológico".

Berners-Lee continua se dedicando ao aprimoramento desse sistema, e comenta que é importante que todos envolvidos nessa tecnologia fiquem atentos aos possíveis benefícios e ameaças que ele possa vir a apresentar, tendo sempre em mente a oferecer uma estrutura que garanta a existência de uma sociedade justa, aberta e democrática. (http://veja.abril.com.br/especiais/tecnologia_2006/p_040.html).Acesso 10/05/2009.

Com essa criação, tornou-se possível a interligação de todos os povos do mundo, como disse Herbert Marshall McLuhan, filósofo e educador canadense, em seu livro “O meio é a mensagem”: "a nova interdependência eletrônica cria o mundo à imagem de uma aldeia global". Concretiza-se então um novo conceito, e esta ‘aldeia global’ tem como ponto de encontro comum o cyberspace ou internet. Como educador, McLuhan chamou muita atenção e trouxe um novo enfoque para a educação, baseado em suas teorias sobre comunicação. Foi criador de um campo de estudos – Comunicação e Educação – que só seria explorado na década de 90. Grande crítico da escola tradicional, o autor canadense aponta os defeitos do sistema e, em sua concepção, a orientação da escola não passa de propósitos exclusivos ao mercado de trabalho, preferindo criticar a mídia a utilizá-la como aliada na educação. Os livros transmitem teorias, afirma McLuhan, e o enfoque para a educação requer mais do que isso, requer interesse por parte de quem aprende; e diz: "Onde o interesse do estudante já estiver focalizado, aí se encontra o ponto natural de elucidação de seus problemas e interesses", completando que esse tipo de educação só pode suscitar em nós o desgosto por qualquer atividade humana.
Em suas obras introduz, também, as expressões ‘o impacto sensorial’ e ‘o meio é a mensagem’ como metáforas para a sociedade contemporânea, ao ponto de se tornarem parte da nossa linguagem do dia-a-dia. Acumulando prêmios, defensores e inimigos, McLuhan publicou outros livros divulgando suas idéias, mantendo sempre uma linha polêmica até sua morte, em 1980. Pelo que podemos observar, não parece que a educação tenha mudado esse conceito mercadológico no contexto dessa sociedade contemporânea, não estando presente, hoje, na educação, o desenvolvimento, a capacidade de julgamento e discriminação através das experiências sociais. É de extrema urgência e necessidade que todo educador reflita sobre sua atuação, no cuidado para com a utilização dos meios e conteúdos pertencentes ao seu material de trabalho, transformando-os em serviços que possam favorecer e fortalecer a formação e o conhecimento de indivíduos voltados à pluralidade, indivíduos com mais originalidade, diversidade, críticos, solidários, cooperativos e que respeitem mais as diferenças individuais e culturais, propiciando realmente uma inclusão social – tema esse, bastante discutido nos centros acadêmicos contemporâneos.

Conforme McLuhan:

“No futuro, educar será sinônimo de aprender a querer progredir, a melhorar; nesse dia educar não será sinônimo de formar e manter homens a meio caminho de suas possibilidades de desabrochamento, mas, ao contrário, abrir-se à essência e à plenitude da sua existência” (Herbert Marshall McLuhan, In Mutations 1990).

Com a banalização do uso da informática iniciou-se uma revolução – hoje através da internet – que segue numa crescente, abalando as bases que até aqui serviram à economia mundial. Este abalo está provocando, entre outros, a abolição dos intermediários, colocando em xeque o ‘comércio tradicional’, ou seja, aquele comércio situado no final de uma cadeia repleta de intermediários: o fabricante, o importador, o distribuidor nacional, o regional, o local e, finalmente, a loja. Com as mudanças impactantes provocadas pela revolução digital, não é nenhum exagero dizer que o comportamento do consumidor pode ser dividido em antes e depois do cyberspace. Nunca em uma sociedade as pessoas estiveram tão saturadas de informações em um espaço tão curto de tempo. A tecnologia digital tornou-se uma grande potência e com isso está cada vez mais inseparável da vida cotidiana dos indivíduos do século XXI. Agindo em termos quantitativos de indivíduos, tem se tornado até um meio obsessivo na busca pelo chamado ‘conforto’. Com isso, o comportamento desses consumidores globalizados passou a ser muito estudado e avaliado no mundo dos negócios. Porém, comportamento é reflexo da personalidade humana, e esta é impossível de ser explicada à luz de uma teoria integrada e consistente e, mesmo que sejam usadas para essa avaliação ferramentas como teorias psicológicas e psicanalíticas, ainda assim é um terreno perigoso e muito enigmático.

Com a internet foi possível a implantação de um sistema chamado e-commerce – comércio eletrônico - vendas efetuadas sem o encontro físico entre o vendedor e o comprador, onde estes interagem eletronicamente. Neste sistema está presente grande número de estímulos visuais, confundindo cada vez mais a atenção do usuário e fazendo com que ignorem as informações transmitidas, que já não são tão claras. O comércio eletrônico não é um fenômeno novo. Há muitos anos que as empresas trocam dados através de uma variedade de redes de comunicação, sendo, até pouco tempo, uma atividade de empresa a empresa através de redes fechadas específicas, como por exemplo, a "BBS" – Bulletin Board Systems, que eram espaços virtuais de troca de mensagens, arquivos, operatividade de negócios etc. O que se verifica atualmente com a implantação do e-commerce é uma expansão acelerada com alterações radicais, provocadas pelo crescimento exponencial da internet.

A pirataria não foi inventada com o eMule. As fotos - gifs coloridas eram o “maior barato” e, claro, tínhamos também os jogos online, acessados por PCs, Amigas, MSX, Apples etc. Como era muito caro ficar conectado via telefone, os usuários tinham um tempo máximo permitido por dia. Os amigos do "sysop" – que comandava o sistema – sempre tinham suas regalias, ganhando uns minutinhos a mais. Que saudade, eu mesma usei muito esse sistema! Se por algum motivo sentir curiosidade, tente acessar a Brain Storm BBS via navegador mesmo. Para algo mais próximo use um modem de 14400 e tente a Thunder Bolt BBS ou uma das outras listadas no site BBS Finder. Esclarecendo, não sou contra a internet ou ao avanço tecnologico, sou contra o modelo de sistema aberto que vem sendo usado, sem limites e sem nenhuma ética, pois sempre há o lado bom e o lado ruim das coisas.

O e-commerce começa, então, a expandir-se rapidamente, numa complexa rede de atividades comerciais efetuadas em escala mundial e entre um número cada vez maior de participantes, empresas e indivíduos, conhecidos e desconhecidos, bem como em redes abertas como a internet. Com a introdução do já citado mundo World Wide Web, a sua forma visual atraiu os sempre famintos por oportunidades, os homens de negócios, tanto os honestos quanto os desonestos. Existe uma infindável quantidade de produtos e serviços à venda na internet por todo o mundo, desde livros, discos, passagens aéreas, vinhos, vestuário, perfumes, até medicamentos, veículos e seguros, funcionando apenas virtualmente, sem a existência de um comércio físico.

O aspecto simbólico assumido pelas mercadorias torna-as um meio de diferenciação de um consumidor perante o outro. Segundo Canclini (2006, p. 63), “a lógica que rege a apropriação dos bens como objeto de distinção não é a da satisfação de necessidades, mas sim a da escassez desses bens e da impossibilidade de que outros os possuam”. Os objetos adquirem, assim, um valor subjetivo, sendo esta a matéria-prima com a qual a publicidade trabalha na criação de posicionamentos que possam ser percebidos pelos consumidores como diferenciais competitivos. (CANCLINI, Nestor García. Consumidores e cidadãos. 6ª ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2006).

O comercio virtual ajudou a acentuar as modificações das relações de consumo, trazendo consigo um novo perfil de consumidor. A tabela abaixo traça um comparativo entre alguns dos conceitos que distinguem o consumo moderno do pós-moderno.

Tabela – Consumo moderno e pós-moderno:

CONSUMO MODERNO - CONSUMO PÓS-MODERNO

Signo de status                                Signo de estilo


Necessidade                                   Desejo


Futuro                                            Presente


Funcionalidade                               Estética


Fidelidade                                      Nomadismo


A Marca                                        Uma série de marcas


Realidade                                       Atmosfera


Funcional                                        Lúdico


Estabilidade                                    Mutação


Bulimia                                           Seletividade


Interação                                        Redes


Seriedade                                       Ironia


Essência                                         Aparência


Unidade                                         Pluralidade


Ou/ou                                            E/e


Visão                                            Tato


Certeza                                          Dúvida


Clareza                                          Ambigüidade


Individualidade                               Estar junto


Fonte: FABRIS, 2003 apud SEMPRINI, 2006, p. 71.

(SEMPRINI, Andréa. A marca pós-moderna: poder e fragilidade da marca na sociedade contemporânea. São Paulo: Estação das Letras, 2006).

Por estarem expostos a uma quantidade cada vez maior de informações e de mensagens publicitárias, os consumidores do século XXI confiam mais nas opiniões uns dos outros do que nas dos profissionais de jornalismo, publicidade e outros formadores de opinião que, aliás, encontram-se hoje, numa posição de total descrédito.

Para Wolton (2006, p. 34), “o cidadão-consumidor do início do século XXI encontra-se numa situação de exposição e de interação sem qualquer comparação com o que sempre recebeu até então”, transformando as relações de consumo e permitindo que encontremos duas figuras contraditórias em um mesmo receptor: a do cidadão considerado hiperativo, cuja vida se resume a lidar diariamente com o computador, substituindo com esta máquina o trabalho antes exercido por várias pessoas, e a do ‘cidadão-consumidor’, escravo dos sistemas de informação interativos (ibidem, p. 34). WOLTON, Dominique. É preciso salvar a comunicação. São Paulo: Paulus, 2006.

Portanto, a publicidade não considera mais o consumidor como simples espectador. Na sociedade de consumo onde está presente o e-commerce, as técnicas tradicionais de vendas vão se tornando obsoletas e sendo substituídas por outras que levam em consideração as características, gostos específicos e hábitos de compra individuais dos consumidores.

A expressão web 2.0 foi primeiramente cunhada pela empresa O’Reilly Media, e atualmente, esse termo vem sendo usado para designar a ‘nova’ internet, com a sua revolução participativa, separando-a do período anterior que compreende desde o boom das empresas ‘ponto com’ até o surgimento dos primeiros blogs e comunidades virtuais. As relações humanas pertencem agora aos conteúdos dos chamados ‘sites de relacionamentos’. A começar pelos blogs e fóruns de discussão, onde se observa uma participação interativa dos indivíduos. Recentemente houve uma explosão de acesso em sites que formam e catalisam comunidades, tais como Orkut, My Space, dentre outros. Na verdade, estas redes de pessoas sempre existiram desde os primórdios da internet, como já citei (BBS, chat, fóruns etc.), e o que aconteceu foi uma aceleração recente do número de usuários destas comunidades, devido à sofisticação tecnológica e a um aumento da base instalada de banda larga, possibilitando agora um novo ‘lar’ aos habitantes da sociedade contemporânea.

O autor Andrew Keen foi um empreendedor pioneiro do Vale do Silício, com o site de música Audiocafe.com. Em seu livro “O culto do amador” escreve que: "Mecanismos de busca como o Google sabem mais sobre nossos hábitos, interesses e desejos do que nossos amigos, nossos entes queridos e nosso psiquiatra juntos." (Pg.25). Ele expõe que aumentando cada vez mais a quantidade de informações online não verificada e não comprovada, não temos outra escolha senão a de sermos um tanto céticos. O que encontramos nessa web 2.0 trata-se de uma cultura infinitamente fragmentada que, ao invés de orientação, se não tomarmos cuidado, acabam passando desorientação, desde as coisas mais banais até com relação às coisas realmente sérias.

Keen nos diz:

"Quando nossas intenções individuais ficam na dependência da sabedoria das massas, nosso acesso à informação é restringido e, em consequência, nossa visão do mundo e nossa percepção da verdade ficam perigosamente distorcidas." (Pg.92).

O plágio está sendo considerado o mal do século na internet. Nesse sentido, há profissionais que consideram este comportamento normal, o que é o fim dos tempos! Frases do tipo: “Se te plagiarem é porque você é bom, você deve encarar como um elogio” são facilmente encontradas na rede. Essa questão também foi colocada por Keen:

"O problema não se resume a filmes e músicas pirateados. Trata-se agora de uma incerteza mais ampla sobre quem possui o quê numa era em que qualquer pessoa, com o clique de um mouse, pode recortar e colar conteúdo e apropriar-se dele. A tecnologia da web 2.0 está confundindo o próprio conceito de propriedade, criando uma geração de plagiadores e ladrões de direitos autorais com pouco respeito pela propriedade intelectual. Além de músicas ou filmes, eles estão furtando artigos, fotografias, cartas, pesquisas, vídeos, jingles, personagens e praticamente qualquer outra coisa que possa ser digitalizada e copiada eletronicamente. Nossos filhos estão baixando e usando essa propriedade furtada para avançar por meio da trapaça na escola e na universidade, apresentando as palavras e a obra de outros como suas em trabalhos, projetos e teses." (Pg.135-6).

É difícil discutir educação nas condições atuais do ensino brasileiro, onde o docente é o primeiro a estar totalmente desorientado, considerando-se, ainda, que há docente se apropriando de ideias originais de alunos. É inquestionável que o uso da internet como fonte de pesquisa é altamente positivo, porém, com o descontrole que estamos presenciando não dá para imaginar onde tudo isso vai parar. Faz parte do aprendizado dos alunos descobrirem como e onde encontrar as mais diversas informações necessárias para uma pesquisa, mas é necessário que lhes seja ensinado como utilizar e interpretar corretamente essas informações encontradas. Esta tarefa começa em casa, onde o papel da família tem grande peso o que, obviamente, deveria ser o principal.

Andrew Keen diz que:

"Nosso desafio é, antes, proteger o legado de nossa mídia convencional e 200 anos de proteção aos direitos autorais dentro do contexto da tecnologia digital do século XXI. Nossa meta deveria ser preservar nossa cultura e nossos valores, ao mesmo tempo em que desfrutamos os benefícios das potencialidades da internet de hoje. Precisamos encontrar uma maneira de equilibrar o melhor do futuro digital sem destruir as instituições do passado”. (Pg. 173).

Vamos tentar ser otimistas e, talvez, quem sabe, os envolvidos nessa criação consigam realizar algum sistema com recursos superiores para que possa haver uma melhora, e que este recurso não demore a acontecer.

Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, sem dúvida um dos mais perspicazes pensadores da atualidade, nos expõe a sutil e gradativa transformação dos consumidores em mercadorias. Bauman examina, ainda, o impacto da conduta consumista em diversos aspectos da vida social, na política, democracia, comunidades, parcerias, construção de identidade, produção e uso de conhecimento, com especial atenção ao mundo virtual, cyberspace, nos conteúdos das redes de relacionamentos.

Na sociedade contemporânea Bauman descreve existir uma ânsia eterna por consumir sempre mais e mais rápido, descartando ainda mais rapidamente o ultrapassado em troca da mais recente novidade. Tal é o caso do seu livro, “Vida para consumo”, que leva este olhar negativo sobre o consumo às ‘vias de fato’ sugerindo que com o surgimento da ‘sociedade líquida’, da sociedade adicta/consumista, criou-se uma sociedade onde os indivíduos se tornam, ao mesmo tempo, os produtores e promotores das mercadorias, e por consequência, a própria mercadoria.

Existe aí uma correspondência, por assim dizer, entre a ‘indústria cultural’ e a tarefa que a ‘sociedade líquida’ impõe a seus sujeitos que é a de produzir para si próprios a continuidade, a solidez e a estabilidade que a sociedade não mais consegue oferecer. E tal busca se dá, cada vez mais, através do consumo. Porém, este é precisamente o motivo pelo qual essa sociedade está fadada ao fracasso. É próprio dessa ‘indústria cultural’ consumista manter-se eternamente no jogo da busca pela satisfação de desejos insaciáveis.

Portanto, a transição do que é realmente necessário e a volatilidade do desejo se complica ainda mais no consumo ‘líquido’, não servindo mais ao atendimento de necessidades e sim de desejos. E é por via destes desejos que os indivíduos contemporâneos estariam sendo induzidos a tentar produzir algum sentimento de ordem e estabilidade, a partir da total falta de solidez ao seu redor. Neste parâmetro, todo e qualquer indivíduo se torna, ao mesmo tempo, produtor, vendedor e mercadoria, todos habitando no mesmo espaço, o do mercado.

Na “Vida para consumo” de Baumn, toda e qualquer pessoa precisa promover a si mesma como um produto desejável e atraente ao consumo para poder, assim, receber a atenção desejada, seja no contexto que for. É, portanto, pela via do espetáculo que o indivíduo moderno consegue alcançar os graus de aprovação social e inclusão que insaciavelmente busca não mais como sujeito, mas como consumidor/mercadoria. Neste ponto, o que mais interessa é compreender a transformação sutil e perversa que estaria no cerne da própria sociedade contemporânea.

Conforme Baumn:

“Tudo isso diz pouco sobre o conteúdo da “revolução consumista”. A questão que exige uma investigação mais atenta diz respeito ao que “queremos”, “desejamos” e “almejamos”, e como as substancias de nossas vontades, desejos e anseios estão mudando no curso e em conseqüência da passagem ao consumismo”. (Vida Para Consumo – Pg.41).

Neste livro, um dos pontos mais fortes da narrativa é o paralelo entre o fetichismo da mercadoria, tal como estudado por Marx na época da ‘sociedade de produtores’, e aquilo que hoje seria um ‘fetichismo da subjetividade’. Tanto um quanto outro se baseiam numa mentira, mesmo estando em lados opostos da dialética diante da condição existencial humana, pois: “Ambas as variações tropeçam e caem diante do mesmo obstáculo: a teimosia do sujeito humano, que resiste bravamente às repetidas tentativas de objetificá-lo”. (Pg.30).

As relações entre sujeitos são fetichizadas, transfiguradas em relações mercadológicas, e este processo atinge seu cume quando a própria subjetividade vira mercadoria, ou quando a vida vira consumo.

Prosseguindo mais um pouco no espaço tecnológico, verificamos que o cyberspace está afetando até os aspectos mais íntimos da vida, sejam pessoais ou amorosos. Para essa argumentação Bauman busca inspiração em sites de relacionamento, nos quais indivíduos desiludidos com a vida tentam encontrar parceiros, os famosos vínculos humanos, sejam eles para amizade, sexo casual, ou um relacionamento dito ‘sério’, enaltecendo suas próprias qualidades e agindo como verdadeiros profissionais de marketing do self.

Há uma mercantilização da vida, processos onde o eu/outro só entra em contato através de uma série de mediações muito bem assessoradas pelos criadores desses sites de relacionamento, tornando esses contatos cada vez mais mercadológicos, pois ao elaborar um perfil em um destes sites, não é o próprio sujeito que é revelado, mas um sujeito fetichizado, uma mercadoria que se relaciona com outras mercadorias, obscurecendo todas as verdadeiras relações pessoais que tornaram aquele contato cibernético possível e pensável.

Em uma entrevista dada ao repórter Alessandro Lanni, publicada no jornal “La Repubblica”, em 21-11-2008, com tradução de Moisés Sbardelotto, Baumn diz que: “Melhor construir uma opinião pública global e confiar-se a organizações cosmopolitas, extraterritoriais e não-governativas”.

A poluição atmosférica e a falta de água potável são questões que têm origem no espaço global, mas depois são as instituições locais que devem geri-las. O mesmo princípio se aplica ao problema das migrações, do tráfico de drogas e de armas, do terrorismo, da criminalidade organizada, da incontrolável mobilidade dos capitais, da instabilidade e da flexibilidade do mercado de trabalho, da alta dos preços dos bens de consumo e assim por diante. A esfera política local é sobrecarregada de tarefas e não é suficientemente forte ou dotada de recursos para resolvê-las. Só instituições políticas e jurídicas internacionais – até agora ausentes – poderão reter as forças planetárias atualmente desreguladas e alcançar as raízes da insegurança global.

A poluição atmosférica e a falta de água potável são questões que têm origem no espaço global, mas são as instituições locais que devem gerí-las. O mesmo princípio se aplica ao problema das migrações, do tráfico de drogas e de armas, do terrorismo, da criminalidade organizada, da incontrolável mobilidade dos capitais, da instabilidade e da flexibilidade do mercado de trabalho, da alta dos preços dos bens de consumo e assim por diante. A esfera política local é sobrecarregada de tarefas e não é suficientemente forte ou dotada de recursos para resolvê-las.

Só com uma política global será possível sair da crise mundial que o mundo contemporâneo está vivendo. A política deve ter a força de reinventar-se em escala planetária, para enfrentar a emergência ambiental ou a discrepância crescente entre ricos e pobres. Se assim não fizer, estará condenada à marginalidade, com instrumentos obsoletos adaptados a um mundo que não existe mais. O inventor da ‘sociedade líquida’ não acredita em uma capacidade de auto-reforma da política.

No universo das adicções surge mais uma – a compulsão cibernética – onde a internet, que apesar de ser um poderoso veículo de comunicação criada neste mundo globalizado para facilitar a vida dos indivíduos (ou não), nem sempre é utilizada de forma adequada e eficaz. O capitalismo está aí, e não para de criar o novo, a mídia chega até nossos lares com propagandas apelativas, gritantes, instigantes, incessantes e outros ‘antes’ possíveis e impossíveis para o consumo de produtos ‘top de linha’, cada vez mais modernos e sofisticados, os quais mal entram no mercado já surgem outros mais modernos e avançados. As crianças ou mesmo os adolescentes, muitas vezes nem sabem utilizar adequadamente essas novas tecnologias, mas é preciso ‘ter’. Por outro lado, os pais ou responsáveis, direta ou indiretamente ligados quase que exclusivamente ao trabalho, raramente podem saber o que acontece com seus filhos durante o tempo em que estão online ou não, com quem conversam e o que conversam.

Em minha opinião, a maior perda que o sujeito tem com o mau uso da internet acontece quando ele entra em um isolamento social, se confina, emudece, transformando o computador em seu amigo inseparável, aquele fiel companheiro de todas as horas. Não goza mais o social, perde o contato com pessoas queridas como pais, irmãos e amigos, construindo um prazer exclusivamente da máquina e quase se tornando parte dela, ficando cada vez mais distante do mundo humano, se tornando extremamente solitário. Esta adicção torna-se um sintoma, trocando uma construção subjetiva por uma construção objetiva e, sem que o sujeito perceba, é criado um mecanismo de defesa contra o inesperado, o estranho, o imprevisível, a emoção, tornando cada vez mais difícil a interação social própria do humano. Temos, então, o predomínio de imagem pictórica e virtual sobre o psiquismo humano, auxiliado pelo recurso do ‘deletar’.

“Nossa ciência não é uma ilusão. Ilusão seria imaginar que aquilo que a ciência não nos pode dar, podemos conseguir em outro lugar”. Sigmund Freud

 
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